Esportes

São Bernardo supera Santo
André também no futebol

DANIEL LIMA - 10/10/2023

São Bernardo nunca foi páreo para Santo André no futebol quando se observa o traçado completo do profissionalismo. Nos últimos 50 anos, por exemplo. Essa supremacia que foi para o beleleu nos últimos anos. Uma das explicações? O prefeito Paulinho Serra e sua turma de imperialistas atrapalham. E o prefeito Orlando Morando, que não se mete no assunto, não atrapalha. 

Faltou pouco domingo para o São Bernardo chegar à Série B do Campeonato Brasileiro. A Série B é o degrau imediatamente inferior à Série A das grandes equipes nacionais. O São Bernardo perdeu no Paraná para o Operário de Ponta Grossa ao sofrer um gol a cinco minutos do final. O empate levaria o time da região a conquistar uma das quatro vagas.  

O Santo André já disputou a Série B do Brasileiro numa temporada, quando subiu à Série A e depois caiu continuamente. Tudo durante a fase de privatização por uma empresa comandada pelo empresário Ronan Maria Pinto, dono do Diário do Grande ABC.  

Já o São Caetano não só disputou a Série B do Brasileiro como também várias edições da Série A. Tudo com o dinheiro farto doado pelo empresário Saul Klein.  

SAUL, MAIOR MECENAS  

Quando Saul Klein resolveu encerrar o período de maior mecenas já conhecido no futebol brasileiro, com R$ 500 milhões de repasses em quase duas décadas, o São Caetano desceu a ladeira. Está na Série A-3 do Campeonato Paulista. A Série A-3 significa a Sétima Divisão do futebol brasileiro. Fosse adotado o alfabeto que distingue as divisões, o São Caetano pertenceria à Série G.  

Resta saber o que vai acontecer com o futebol da região nos próximos 10 anos. Esse é um período mínimo para ter a certeza de que certezas de hoje serão certezas de amanhã. E que embromações de hoje continuarão a ser embromações de amanhã.  

Hoje é certo que o Santo André confirma a condição de primo-pobre do futebol regional. Quando fiz essa abordagem há alguns anos, houve quem estranhasse. Até porque o primo rico ao qual me referia era o Água Santa de Diadema. O tempo provou que estava certo. E continuo certo.  

MODELOS DIFERENTES  

O Água Santa é o primo rico. O São Bernardo é de outra categoria de administração. Tem um empresário do futebol a comandá-lo com especificidades que não rondam aparentemente nenhum escândalo.  O Água Santa é de uma categoria de empresários de transporte coletivo demasiadamente relacionados com o Poder Público. 

Já o São Caetano, há muito tempo caiu na vida. Mergulhou numa crise que parece não ter fim. Nem deveria ser catalogado com um dos quatro times mais importantes da região. Mas está na lista por conta do passado de glórias. Campeão paulista e vice-campeão da Libertadores da América são estoques de láureas que jamais podem ser minimizados.  

A ultrapassagem do Santo André pelo São Bernardo como maior expressão do futebol da região se deve muito a duas realidades distintas. O São Bernardo virou clube-empresa de sucesso crescente e sem viés político como o fora nos tempos do PT na Prefeitura. Tudo porque o prefeito Orlando Morando não atrapalhou. Orlando Morando sabe os limites de uma Administração Pública no futebol. O vizinho Paulinho Serra está longe disso. É um invasor despudorado.   

AVANÇAR OU PERECER  

O Estádio Primeiro de Maio, que só representava despesas à Prefeitura de São Bernardo, foi cedido ao clube privatizado durante a gestão petista da Prefeitura e que, mais tarde, foi repassado a terceiros. Repetir essa transição de privatização não é demais. Privatização fortemente influenciada pela política partidária é um erro tanto quanto impedir a privatização em forma de SAF (Sociedade Anônima do Futebol), modalidade aprovada pelo governo federal e que já contempla várias equipes nacionais. Inclusive o Botafogo do Rio, favorito ao título da Série A desta temporada.  

O prefeito de Santo André, Paulinho Serra, é um interventor branco, um ramal do imperialismo generalizado que rege a vida da cidade. Há dois anos a Prefeitura faz suspense sobre a cessão do Estádio Bruno Daniel. Vai engabelando a diretoria do Santo André que se tem mostrado mais paciente do que as necessidades de competição no futebol brasileiro.  

DIRETORIA PRESSIONADA  

A direção do Santo André optou pela estrada da diplomacia porque possivelmente arbitrou os ônus e os danos de um confronto. Quem tem o poder monolítico de Santo André estaria disposto a tudo para retaliar adversários. Ou, então, para cooptar. 

Conselheiros do Santo André que aprovaram o regime de SAF no final do ano passado estão irritados com a demora. Acreditam que esteja faltando à diretoria executiva determinação para acelerar o cronograma.   

O Santo André desta temporada disputou a Série D do Campeonato Brasileiro e não passou da primeira fase. O custo da folha de pagamentos do Santo André não chegou a R$ 100 mil. Algo por volta de 20% do que investiram o São Bernardo e a maioria dos times mais competitivos da Série C. 

O Santo André gastou a cada 30 dias bem menos que uma dívida deixada pelo Saged, o Santo André privatizado em meados da década passada. Uma dívida que só está sendo totalmente resgatada agora. No acumulado de desembolso em quase cinco anos, foram R$ 10 milhões de acordo judicial.   

PRIVATIZAÇÃO DESASTROSA  

O Santo André fez o pior negócio do mundo ao cair na armadilha do Saged, como se chamava o Santo André Gestão Empresarial e Desportiva de Ronan Maria Pinto. Os esqueletos financeiros subsistem. O estoque de jogadores desapareceu em negociações obscuras.  

O time vice-campeão paulista foi negociado em seguida. Calcula-se que o prejuízo geral do Santo André chegaria em valores de hoje a mais de R$ 40 milhões. Só o estoque de jogadores do período associativista que se converteu em negócios representou uma fortuna como ativos do Saged.  

O segredo que move os tentáculos poderosos da Administração de Paulinho Serra à transformação do Santo André em SAF está fechado a chaves de interesses difusos.  O prolongamento do prazo para Paulinho Serra e sua turma retirarem o peso de estranhezas não identificadas de forma a que o campo esteja aberto à confirmação de interesses de empreendedores esportivos representa perda de terreno no ambiente de novos negócios ditados pelo modelo de SAF. 

PODER MASSACRANTE  

Há toda uma estrutura de poder em Santo André que exige de terceiros em qualquer atividade a benevolência da administração municipal. Sobretudo quando a decisão depende da concordância da Administração Municipal.  

O Estádio Bruno Daniel é a chave de ignição da privatização do Santo André. Nenhum grupo de empresários arriscaria o pescoço em fechar negócio com o Santo André sem passar pela garantia de uso do Estádio Bruno Daniel.  

Esse é o ponto de atravancamento. Trocando em miúdos: o Poder Público precisa repetir o que São Bernardo, São Caetano e outros administradores fizeram e fazem, ou seja, sair de um jogo para o qual não foi convidado.  

A Administração Municipal de Santo André se mantém em silêncio sobre o turbilhão de versões que a colocam como interessadíssima demais nas negociações.  

FALTA TRANSPARÊNCIA  

Quem estiver pensando em algo pecaminoso não precisa se recriminar. Quem não tem transparência com decisões públicas é obrigado a aceitar especulações. O problema é que o prefeito Paulinho Serra e sua turma de imperialistas são impetuosos. Eles olham às instituições que supostamente representariam responsabilidade social e responsabilidades diversas como peças descartáveis a título de contenção de ambições.  

O atraso de competitividade do Santo André é um atraso comprometedor porque não só sofre derrotas internas, com o Água Santa e o São Bernardo escalando a hierarquia de forma mais vigorosa, como também na capacidade de concorrer no mercado de SAF.  

Espera-se que o desgaste tenha uma resposta do clube que interrompa e reverta os prejuízos. E a melhor alternativa é, apesar dos pesares da Prefeitura, aproveitar todo esse período de espera para definir um modelo de privatização que supere tanto o individualismo acionário do São Bernardo quanto o coletivismo pouco transparente do Água Santa.  

BRAGANTINO EXEMPLAR  

O melhor dos melhores recortes institucionais possível para um clube com o tamanho do Santo André seria um golpe de sorte semelhante ao do Bragantino, que se tornou Red Bull. O clube do Interior Paulista pertence a um grupo empresarial do ramo internacional de energéticos que tem no futebol uma ferramenta de marketing de negócios paralelos de ganhos sistêmicos.  

O Santo André que já foi maior que o Bragantino no passado. Hoje está a léguas de distância e dificilmente vai contar com o mesmo bilhete premiado.  

Espera-se apenas que resista aos interesses do Paço Municipal e não se entregue a um modelo contaminado por voluntarismo, como foi o caso da Saged. E tampouco repita modelos societários que infrinjam os princípios de clube associativo mais representativo da região. Juntar negócios do futebol com representatividade social do futebol é o melhor antídoto contra equívocos que podem custar caro.   

CIDADANIA ESPORTIVA  

Nenhum enquadramento hoje vigente no futebol da região conta com essa característica. O Santo André associativo sente a falta da perna empresarial. Os demais clubes têm a perna empresarial e pecam pela ausência constante da comunidade. Torcer para o time quando o time está numa final importante é uma coisa. Integrar-se ao clube no dia a dia, é outra.  

Santo André sempre contou com cidadania esportiva, mas aos poucos está se esvaindo porque a competição se torou mais cruel. Conselheiros já perdem a paciência com a diretoria. 

Perder o clássico econômico para São Bernardo após a chegada das montadoras de veículos, da Rodovia Anchieta e do estrangulamento da Avenida Industrial, é uma dor prolongada, mas já assimilada por Santo André. Agora, no futebol, perder de goleada sem o direito de competir, é outra coisa.  



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