Para não virar o que virou Santo André, porque Santo André virou o pior exemplo possível de democracia, uma democracia de araque quando se trata de disputas eleitorais locais e desdobramentos de gestão pública, para não virar o que virou Santo André, a vizinha São Bernardo precisa manter pelo menos um vértice do quarteto de ramais político-partidários que se enfrentaram nas últimas eleições municipais.
É claro que me refiro ao Morandismo, em primeiro lugar a ponte mais segura ante a possibilidade de uma derrocada geral. O Manentismo e o Petismo são menos propensos a sustentarem impedimento de um redesenho que levaria a algo semelhante ao Serrismo de Santo André.
O Marcelismo é neste momento, e este momento começa com a vitória em outubro último, o mais viável e horrorosamente modelo próximo do Serrismo, fonte de centralismo, para não dizer imperialismo, que faz de Santo André um show de autocracia disfarçada. Quem ousar se opor aos imperialistas de Santo André tem hora marcada com perseguições implacáveis.
CIDADES DIFERENTES
Sempre escrevi quando o assunto é o perfil eleitoral da região que não tem sentido algum comparar como muito se comparou Santo André com São Bernardo, na tentativa de vender a mensagem que o então prefeito de Santo André, Paulinho Serra, tinha mais aprovação que Orlando Morando, então prefeito de São Bernardo.
Comparar Santo André e São tem o mesmo sentido lógico de acreditar que palmeirenses e corintianos são a mesma coisa, com a diferença das cores nas camisas. Uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa. Há especificidades que estabelecem as diferenças.
Já escrevi muito sobre isso também, mas, resumidamente, a classe rica e a classe média de São Bernardo são menos numerosas proporcionalmente ante o total de moradores do que as respectivas classes em Santo André. E são classes rica e média distintas de Santo André. Em Santo André os pequenos industriais e comerciantes, e o domínio econômico até a chegada da Anchieta, forjaram uma sociedade de incluídos mais numerosa e de outra configuração cultural. Em São Bernardo a classe rica tradicional sempre foi menos representatividade que a de Santo André e a classe média saiu das chefias e trabalhadores mais graduados do setor industrial, principalmente automotivo.
ANTES E DEPOIS
O resumo desse confronto é a ascensão da classe trabalhadora impulsionada pelo PT sob a influência dos empregos nas montadoras de veículos e grandes autopeças, principalmente.
Para se dobrar ao imperialismo do grupo que tem em Paulinho Serra o garoto-propaganda de uma causa revestida de suposta democracia, São Bernardo precisaria caprichar na dose de embriaguez política. Não correrá risco nesse sentido enquanto os Morandos estiverem nas paradas.
Quanto ao Petismo e ao Manentismo, não coloco as mãos nem a língua no fogo. No fundo, são Marcelistas potenciais. Aliás, como o petismo já o foi nas últimas eleições, tendo à frente o deputado Luiz Fernando Teixeira, derrotado em primeiro turno.
Não custa lembrar aos apressados que ao chamar os petistas de Petismo, faço uma distinção essencial entre uma coisa e outra. E isso vale para todo o Grande ABC. O Petismo eleitoral nas disputas municipais não tem a mesma força do petismo eleitoral nas disputas federais. Seria melhor, portanto, chamar petismo de algo sem a influência dominadora de Lula da Silva, e lulista quando Lula da Silva entra em campo para valer, com nome, sobrenome e história.
MAIS UM POPULISTA?
Não quero fazer ainda juízo de valor do prefeito Marcelo Lima para dizer o que penso ainda de forma precária. Acho provisoriamente o prefeito de São Bernardo tudo aquilo que pode ser empacotado como agente populista da escola de Paulinho Serra. Aliás, até desconfio que o marqueteiro que os move seja o mesmo. Se não o for seria da mesma linhagem.
Eles, esses marqueteiros, terão mais dificuldades para dar a Marcelo Lima a robustez eleitoral de Paulinho Serra. Afinal, além de cidades diferentes, mesmo que vizinhas geograficamente, existe um osso duro de ser roído que atrapalharia o prefeito de São Bernardo.
Diferentemente de Paulinho Serra, saído da classe média de Santo André, como Celso Daniel no passado (a comparação não tem nada a ver com competência, entre outras qualidades), Marcelo Lima é filho da periferia e da periferia não saiu nas urnas eleitorais de outubro passado. E dificilmente passará mesmo que faça um governo municipal sustentável para concorrer à reeleição.
REJEIÇÃO EVIDENTE
Há uma rejeição implícita a Marcelo Lima entre as classes de famílias ricas e de classe média tradicional de São Bernardo. Não tenho números detalhados das urnas eleitorais de outubro passado, mas as informações que detenho são suficientes para assegurar que a preferência por Orlando Morando e Alex Manente é avassaladora nesses dois nichos.
O apoio explícito do Morandismo a Marcelo Lima no segundo turno do ano passado não demoveu grandes parcelas de ricos e classes médias. Se o Morandismo optasse por apoiar Alex Manente, a história poderia ser outra. Mas Manente faz parte da turma de imperialistas de Santo André.
Marcelo Lima sabe que plantar nessa horta não gerará hortaliças robustas, por isso investe desde já na periferia. Marcelo Lima fala a língua do povão como ex-animador de festinhas. Ensaia uma administração de eventos. É habilidoso por excelência. Como São Bernardo é uma terra em processo permanente de deterioração socioeconômica, como comprovam dados que canso de expor há 35 anos nesta revista digital, antes revista de papel, é de se respeitar o potencial de sucesso de Marcelo Lima.
CLASSE PRECÁRIA
Mas não custa lembrar, também, que o Morandismo é relativamente forte nas periferias, também, principalmente naquela faixa que separa a classe média tradicional da classe média precária. Quem não sabe o que é classe média precária precisaria ler o que já escrevi sobre isso, mas, resumidamente, é aquela turma que superou os domicílios de pobres e miseráveis, e que também foi rebaixada da turma de classe média tradicional.
Alguns supostos estudiosos chamam esse pessoal de, simplesmente, Classe C. Prefiro chamar de classe média precária porque, a depender do balanço do navio macroeconômico, pode engrossar as famílias de pobres e miseráveis. Muito dificilmente aqueles que foram rebaixados ao longo dos anos voltarão à condição de classe média tradicional.
Para que o plano de Marcelismo do eleitorado de São Bernardo dê certo – o que não seria necessariamente imperialismo do padrão de Santo André -- basta o apoio do PT de Luiz Fernando Teixeira. Um apoio mais que notório já no começo deste ano, se não bastasse as urnas do ano passado, e fazer refluir eventual surto oposicionista de Alex Manente, deputado federal ao que parece fadado a ser eternamente deputado federal.
DEPUTADO ETERNO?
Afinal, como duvidar que Manente não passará de deputado se antes contava com o PT e o Morandismo como adversários de força superior, e agora apareceu Marcelo Lima para debilitá-lo ainda mais? E olha que a configuração política nacional favorece muito a todos os deputados federais que se candidatam às prefeituras. As emendas parlamentares são um caminhão de vantagens a sensibilizar forças locais. Da mídia e de nichos da sociedade como um todo. Manente está frequentemente nas mídias locais, sempre com noticiário propagandístico.
É verdade que em política tudo é possível, visto que colunas vertebrais de determinados protagonistas são gelatinosas. Está aí Geraldo Alckmin que não me deixa mentir. E tantos outros que dizem uma coisa hoje e coisa totalmente oposta amanhã.
Entretanto, não existiria possibilidade de São Bernardo converter-se integralmente em Santo André imperialista. Haveria sempre um Morandismo a permear o eleitorado. E o Morandismo, goste-se ou não, marca posição conservadora e antagonista ao petismo.
Nada melhor, portanto, para a democracia, do que o contraditório, e mesmo, em situação de escolha de Sofia eleitoral, a própria polarização. Duro mesmo é ser engando por falsos antagonismos que de fato e para valer sempre foram versões de capitanias hereditárias negociadas dentro de certos concertos de embromação.
A morte de Celso Daniel, por exemplo, aproximou tucanos e petistas que, até então, eram mesmo concorrentes no Estado de São Paulo. Em retaliação às críticas petistas ao desleixo com a Segurança Pública, empesteada de sequestradores, os tucanos invadiram o quarto secreto e delicadíssimo de corrupção na Prefeitura de Santo André.
Uma força-tarefa do Ministério Público foi escalada para melar o jogo. Geraldo Alckmin mandou vincular o crime a propinas. Ou seja: tirou a morte do prefeito do espaço criminal e o colocou no espaço administrativo. Conheço bem esse enredo.
As forças midiáticas, empresariais e políticas que querem fazer de São Bernardo uma Santo André dominada e controlada, utilizando inclusive a regionalidade como cavalo de Troia, vão encontrar dificuldades para tornar operação sucesso total.
OPERAÇÕES DISTINTAS
Se os petistas se entregaram por baixo dos panos aos serristas em Santo André, em São Bernardo a operação será dissimulada, mas nem tanto. Até porque já se ensaiam os primeiros passos. Manente tem flexibilidade de ginasta campeão olímpico. Mergulhará com entusiasmo no que mais lhe for conveniente. Não teme profundidade alguma porque conta com salva-vidas que lhe dão sustentação nas campanhas eleitorais.
Para o Manentismo, o mais importante é estar na política; A Prefeitura de São Bernardo é um sonho adiado constantemente sem causar traumas com derrotas-vitórias. Afinal, a cada novo revés, aumenta a memória eleitoral que o embala na próxima disputa proporcional.
Vamos tratar nos próximos dias de outras cidadelas regionais sob o controle preliminar ou já avançado do imperialismo de Santo André. Diadema resiste bravamente com o PT.
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24/03/2025 IMPERIALISTAS QUEREM DOMINAR SÃO BERNARDO