Economia

Avenida dos Estados está
muito longe do razoável

DANIEL LIMA - 11/01/2024

O futuro da Avenida dos Estados está longe de se apresentar como minimamente transformador e mobilizador econômico. A dinheirama que o prefeito Paulinho Serra tem investido para recuperar materialmente o trecho de Santo André do outrora e distante fator positivo de industrialização da cidade está distante de ser o que o prefeito e seus áulicos festejam, ou seja, uma ferramenta de atualização logística e de raízes estruturantes. Bobagem. 

Dizer que a Avenida dos Estados ganhou obras reestruturantes que demarcariam a diferença no comportamento econômico de Santo André frente a concorrência é acreditar que uma equipe de Segunda Divisão pode disputar a Champions League porque contratou um bom reforço.  A decadente Santo André precisa muito mais que os reparos restritos a um trecho da imensidão de inconformidades da Avenida dos Estados.  

A Avenida dos Estados, que corta São Caetano, Santo André e Mauá, vinda que vem da Capital, é um organismo debilitado com inúmeras enfermidades. Não será uma ponte de safena que resolverá a situação de uma septicemia.  

APENAS OBRAS  

O prefeito de Santo André repete surrada prática de prefeitos em geral que só pensam em produzir obras, quando o dinheiro aparece ou é emprestado, sem se dar conta de que a produtividade do investimento em forma de transversalidades não pode ficar em segundo plano. E o trecho de Santo André da Avenida dos Estados é exatamente isso – milhões financiados por banco internacional que interferirão escassamente no ecossistema econômico e no ambiente concorrencial por investimentos. 

Paulinho Serra é o mais bem aparelhado administrador público da região em matéria de marketing político. Os efeitos diretos na popularidade se contrapõem à efetividade de resultados. A Avenida dos Estados faz parte desse corolário de reticências quando aprofundadamente observado. 

ALGUMAS PERGUNTAS  

Qual é o plano econômico que desenvolveu à amplitude das margens urbanas à direita e à esquerda da Avenida dos Estados na geografia de Santo André?  

Quais medidas técnicas foram debatidas e aprovadas para reformatar aquela imensa área sem cair na armadilha da logística corporativa de efeitos vinculantes de baixo grau?  

Que tipo de desenvolvimento econômico será possível implantar na Avenida dos Estados para potencializar uma Santo André que cada vez mais cai no ranking do PIB per capita no Estado de São Paulo – está na posição 181.  

Qual é a atual ocupação econômica da Avenida dos Estados, no trecho de Santo André, e quais seriam as alternativas que poderiam ser objeto de investimentos a partir de um plano específico de reformatação daquela área? 

CADÊ AS RESPOSTAS?  

Nada disso foi preparado dentro de uma perspectiva de competitividade econômica ao longo de sete anos para dar respostas efetivas, coordenadas e operacionalmente encaixadas em ganhos múltiplos. O enigma da Avenida dos Estados permanece. Antecessores de Paulinho Serra trombetearam ocupação econômica que jamais foram convertidas em planejamento modificador.  

Por isso, quando o prefeito Paulinho Serra propaga supostos efeitos milagrosos em termos de logística relacionadas às obras da Avenida dos Estados em Santo André, é melhor se preparar para a realidade. O prefeito confunde dois tipos de mobilidade urbana em forma de logística corporativa e logística urbana. 

Logística corporativa é o que algumas empresas que se instalaram e outras que se instalarão na Avenida dos Estados utilizam como fórmula de aproximação com os consumidores da região. É a chamada logística de última milha. Produtos de origens distintas encontram entrepostos locais para distribuição em veículos de menor porte, apropriados à superação das armadilhas urbanas infestadas de congestionamentos.  

MUITA DIFERENÇA  

O comércio eletrônico é a matriz suprema dessa empreitada. Os empregos são cada vez menos numerosos nos condomínios logísticos, atividade seduzida pela tecnologia. A remuneração operacional é baixa.  

Já logística no sentido de mobilidade urbana é outra história. É o encadeamento complementar e interativo de uma estrutura viária independente da territorialidade física. O ABC Paulista é ruim de mobilidade urbana porque é uma parafernália de ruas e avenidas cada vez mais congestionadas. Salvam-se entre mortos e feridos, e mesmo assim com muito sofrimento, uma São Bernardo próxima a grandes corredores rodoviários (Imigrantes, Anchieta, Rodoanel) e uma faixa de Mauá, no Bairro Sertãozinho. O restante é só dor de cabeça.  

UM EMARANHADO  

Portanto, logística no sentido mais completo e complexo, em forma de mobilidade urbana, de ganhos coletivos, é um emaranhado bem ou mal resolvido de potencialidades para encurtar a distância entre dois ou mais pontos, preferencialmente mais de dois pontos. E nesse caso o conceito de produtividade logística não tem necessariamente relação com a menor distância a ser percorrida. No caso, o que vale mesmo é a melhor distância. Entre melhor distância e menor distância há muita diferença. 

Gostem os triunfalistas ou não, no caso da região como um todo, exceções a pontos específicos em que a mobilidade urbana atende a determinados interesses, o que temos é um caos nesse quesito de extrema importância à atração de investimentos produtivos.  

A logística apregoada por Paulinho Serra, sem relação com mobilidade urbana, é um cavalo manco que se pretende competidor em meio a concorrentes bem nutridos e robustos.  

Quando se soma à especificidade material da Avenida dos Estados a ausência de planejamento a induzir investimentos que agreguem parte de valores perdidos com a desindustrialização, o desastre é completo. 

NEM TUDO PERDIDO  

Daí a sugerir que o prefeito de Santo André gastou e está gastando dinheiro à toa para dar modernidade ao trecho local da Avenida dos Estados vai muita diferença. Haverá possíveis ganhos internos em logística viária muito específica, ou seja, de mobilidade urbana em determinadas áreas, que atenuaria o rebaixamento da qualidade de vida de quem, como usuário permanente, sente os efeitos ruinosos de uma Avenida dos Estados em constante decomposição.  

Entretanto, nada disso pode servir de plataforma de ilusão. Santo André herdada por Paulinho Serra está encalacrada no quesito mobilidade urbana. E o prefeito vende ilusão ao propagandear um paraíso no futuro.  

O prefeito de Santo André teima em compartilhada a ineficiência histórica do traçado e dos pecados da Avenida dos Estados. Perfila-se, portanto, também como agente público devedor. Ou seja: ao invés de denunciar o presente de grego que recebeu dos antecessores, coloca-se inadvertidamente entre os responsáveis históricos. O marketing de tiro no pé o instalaria como o único vencedor quando, de fato, Paulinho Serra assume-se como principal devedor, que é o custo de uma operação de restruturação inevitavelmente frustrante no campo econômico.  

VOLTANDO NO TEMPO  

Numa entrevista nos primeiros tempos do prefeito Paulinho Serra, fizemos uma abordagem específica sobre a Avenida dos Estados. Vale a pena o resgate:  

CAPITALSOCIAL -- Existe uma relação estreita, embora não única, entre o esgotamento da Avenida dos Estados como estimuladora da produção e a desindustrialização de Santo André. O senhor considera irreversível a derrocada industrial de Santo André? Já encontrou uma saída que possa amenizar os estragos históricos? O terciário de Santo André, ao contrário do que pretendia o então prefeito Celso Daniel, não tem nada de agregador de riqueza. Perdemos a batalha pela Tecnologia da Informação? Ficamos com o ramal mais frágil do setor de serviços?   

PAULINHO SERRA -- A nova Luops (Lei de Uso e Ocupação do Solo) identificou cerca de dois milhões de metros quadrados ao longo do eixo da Avenida dos Estados e limitou a utilização para atividades comerciais. Cabe a uma gestão moderna, identificar e estimular diversas atividades comerciais. Nossa região é muito forte e atua com destaque na indústria 4.0, no segmento de tecnologia da informação e comunicação, no setor automobilístico, na química e petroquímica, além da indústria do plástico e da borracha. A batalha pela tecnologia da informação ainda não foi perdida, visto que ainda continua em expansão. Temos uma gestão atenta a esse tema, alinhada com as potencialidades existentes, em diálogo com as universidades regionais e atenta às novas oportunidades que esse mercado ainda produz.  

CAPITALSOCIAL -- O senhor tem alguma ideia do que fazer para minimizar a herança de estrangulamento logístico de uma Santo André que há décadas deixou de ter a centralidade da Avenida dos Estados como veio de articulação econômica da região, mais especificamente com a chegada da Rodovia Anchieta, depois com a inserção da Imigrantes e mais recentemente com o desembarque dos trechos sul e leste do Rodoanel? O que era elemento de potencialização de dinamismo econômico, no caso a Avenida dos Estados, virou estorvo à mobilidade urbana. O que fazer?  

PAULINHO SERRA – Como gestor público, não posso encarar como estorvo as dificuldades de uma cidade que não foi devidamente planejada. De fato, a Avenida dos Estados está abandonada há décadas e o resultado desse descaso se materializa com a queda de pontes e o solapamento de suas margens. Precisamos buscar apoio dos municípios vizinhos e também do DAEE (Departamento de Águas e Energia Elétrica), do governo do Estado, para receber auxílio na execução dos serviços de contenção das margens do Tamanduateí e das pontes. Fizemos um estudo que indica o custo total R$ 79,2 milhões para a contenção das margens, bem como a reconstrução das pontes e serviços de recapeamento asfáltico. Desse total, R$ 19,4 milhões seriam destinados a obras de contenção das margens, R$ 43 milhões para construção de pontes e R$ 16,8 milhões para recapeamento asfáltico. E a importância que o atual governo dá à Avenida dos Estados é tanta que está inserida no projeto apresentado ao Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID -- que busca captar US$ 25 milhões para importantes obras de mobilidade, em especial dois viadutos na própria avenida, desafogando o gargalo.   

ENTREVISTA AO DIÁRIO   

Para completar, extraímos a parte da entrevista que Paulinho Serra concedeu ao Diário do Grande ABC de 28 de dezembro último, que trata especificamente da Avenida dos Estados:  

DIÁRIO DO GRANDE ABC -- Neste ano houve a entrega da nova Avenida dos Estados, via que, no seu planejamento de gestão, seria grande impulsionadora de novos negócios. Já foi possível sentir mudança a partir da revitalização do trecho andreense?  

PAULINHO SERRA -- O ressurgimento da Avenida dos Estados, como eixo logístico sobretudo, resultou em mudança muito importante na busca da nova vocação econômica da cidade. Isso começou com a reestruturação da avenida, com a vinda do governador Tarcísio (de Freitas, Republicanos), o Complexo Santa Teresinha, que a gente abriu parcialmente o viaduto e está em construção. A nova avenida vem em um pacote de investimento e reestruturação, revisão do Plano Diretor, incentivo fiscal, desburocratização. Levamos novamente o olhar do setor produtivo, que voltou a investir. A Femsa Coca-Cola, a Royce Connect ampliando, o centro logístico da MBigucci (chamado de Business Park Santo André), que já tem 100% de locação e com a fase dois e fase três em andamento, a Goodman, que adquiriu a área da Rhodia, que será o maior centro logístico do País, com dois pavimentos para estacionamento de carretas. Para nós é muito importante porque, em matéria de desenvolvimento econômico, o futuro é eclético.  



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