-- Então, por que a gente não constrói logo, sem demora, uma espécie de Estado da Grande São Paulo? Já há estudos do Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial nesse sentido. Seus autores ficam meio envergonhados de divulgá-lo com ênfase porque temem ser criticados. Você não acha, São Paulo, que nós todos, os sete municípios do ABC e o conjunto dos 39 municípios da Grande São Paulo, poderíamos formar o Estado da Grande São Paulo, como a Grande Tóquio e a Grande México?
-- A idéia é ótima, porque assim poderíamos ter, querida São Paulo, mais 70 deputados federais em Brasília. Seria a maneira que nós, paulistas, encontraríamos para dar um drible da vaca na distorcida representação nacional de que somos vítimas, porque só temos 70 em mais de 500 deputados federais. É muito pouco. Nosso voto vale quase nada perto dos votos da maioria dos Estados. Se o princípio de representação política fosse da proporcionalidade do eleitorado, esse desequilíbrio desapareceria.
-- Santo André falou na hora certa e acertou na mosca, São Paulo. Mas temo que isso não passe de sonho. Será que os caciques políticos do Norte e do Nordeste vão permitir essa jogada de mestre? Como acreditar que vamos ter essa virada se a maioria dos votos do Congresso Nacional está no eixo Norte/Centro-Oeste/Nordeste?
-- Olha, São Caetano, tudo é possível neste Brasil varonil, mas que as dificuldades seriam muitas, pode acreditar. Estou sabendo, no entanto, que é possível negociar no Congresso Nacional uma eventual constituição legal do Estado da Grande São Paulo em troca de uma divisão constitucional do Amazonas. Vocês acham que eu, a formosa cidade de São Paulo, não toparia ser a Capital do Estado da Grande São Paulo? Podem alguns pensar que deixaria de ser o centro nervoso do Estado de São Paulo como é hoje, mas isso é bobagem. Juridicamente, teria mil vantagens como Capital da Grande São Paulo. E, de fato, continuaria a concentrar os interesses políticos, econômicos e institucionais do Estado de São Paulo que conhecemos hoje. Traduzindo a equação: teria mais recursos financeiros do que tenho hoje, e que a Grande São Paulo tem hoje, e ainda manteria minha posição de liderança no xadrez institucional do Estado de São Paulo.
-- O que me entristece, meus irmãos, é que é tão flagrante a necessidade de mudanças que considerem a Região Metropolitana de São Paulo um caso especialíssimo na estrutura constitucional e institucional do País que ninguém se movimenta de fato nesse sentido.
-- Mauá está certa, São Paulo. Acho que teria uma valorização de meu patrimônio turístico se pertencesse a esse novo Estado. Mas é evidente que esse assunto não interessa ao próprio Estado de São Paulo. A divisão poderia contrariar determinados interesses econômicos e políticos. Enquanto isso a gente sofre, porque apenas parte dos impostos federais e estaduais gerados na Grande São Paulo volta de fato para a Grande São Paulo. A maior parcela não vai nem mesmo para o restante do Estado de São Paulo, mas para outros entes da Federação. Subsidiamos muitos dos escândalos regionais que a imprensa está cansada de explorar. Sabe por que, querida São Paulo? Porque acham que somos ricos só porque geramos riqueza. Que adianta o Grande ABC gerar 3% de todo o PIB brasileiro e ficar com apenas migalhas dessa riqueza?
-- E eu, São Paulo, vizinha de Ribeirão Pires, também só teria a ganhar com o Estado da Grande São Paulo. Certamente todos teríamos mais recursos do ICMS, por exemplo. A distribuição desse imposto, que é a principal fonte de receita da maioria das cidades brasileiras, é extremamente injusta. O aspecto populacional é subestimado na fórmula mágica que encontraram para a distribuição das riquezas produzidas.
-- Pelo que vejo, minha gente, se até Rio Grande da Serra, lá no fim do mundo da Grande São Paulo, aprova essa idéia, então não dá nem para pestanejar. Pare de fazer gestos, Santo André, e fale logo...
-- Não dá mesmo, São Paulo. Rio Grande da Serra falou em injustiça e eu sou vítima disso. Veja no quadro de distribuição do ICMS per capita o quanto valem os quase 650 mil moradores de Santo André em relação, por exemplo, à Paulínia, que tem apenas 50 mil habitantes. Sabe qual é minha situação? Paulínia recebe 22 vezes mais recursos do ICMS por habitante do que eu. E sabe por quê? Porque enquanto perdi indústria e inchei de população, Paulínia ganhou indústria química e petroquímica moderna, que poupa mão-de-obra. Como o dinheiro do ICMS é devolvido de acordo com a receita da produção, e não pelo equilíbrio de produção e população, que deveria ser a lógica, fico a ver navios. Como ao longo dos anos ganhei mais população e perdi indústrias, minha situação ficou crítica.
-- Meus Deus! Tenho mesmo que ratificar minha opinião. A saída é mesmo o Estado da Grande São Paulo.
-- Concordo, São Paulo. Como sua vizinha de tantos dissabores, acho que desta vez choveria na minha horta porque ganharia com o crescimento de sua importância político-institucional. Afinal, claro que você seria mesmo a Capital desse novo Estado.
-- E você duvida disso, Diadema?
-- De jeito nenhum, de jeito nenhum. Se as luzes brilharem mais para você e a gente for inteligente para aproveitar a claridade, todos ganharemos.
-- Ainda bem, ainda bem. Só estou encafifada com São Bernardo, que até agora não se manifestou sobre o Estado da Grande São Paulo. Será que a proposta não lhe agrada? Será que o sucesso histórico do sindicalismo embalou de tal modo que São Bernardo está pensando em levar para a prática a idéia da República Sindicalista, como propagandearam em outros tempos?
-- Estão vendo, meus irmãos? São Paulo está me discriminando.
-- Discriminando, São Bernardo? Só fiz uma perguntinha.
-- E que pergunta sem cabimento para uma dama tão bela como você! Por acaso você acha que sou burro de desprezar um achado como esse! Se há experiências internacionais que dão tratamento diferenciado para regiões metropolitanas como a nossa, então que façamos força para mudar a Constituição. Pensei que você estivesse duvidando do meu engajamento só porque temos fama de contestadores. Pensa que não? Até hoje pagamos o pato de ter criado o chamado Novo Sindicalismo. Fizemos uma revolução nas relações entre capital e trabalho, mas tem gente que não entendeu bulhufas disso. Queriam que o trabalhador continuasse sem voz. Quando falamos em República Sindicalista não temos sonho de separatismo, mas a intenção explícita de vender a imagem de um Município que sabe valorizar a relação entre quem detém o capital e quem participa do desenvolvimento econômico com o trabalho.
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16/04/2002 UM QUEBRA-CABEÇAS