Responsabilidade Social Empresarial, que vou tratar pela sigla RSE, é fator de grande relevância não só para o desenvolvimento comunitário como para o desenvolvimento econômico. A pesquisa que suporta este artigo foi realizada em empresas do Grande ABC em parceria com o professor doutor Gino Giacomini Filho em 2005. De início, elenco alguns motivos para ser uma organização socialmente responsável:
Pagar rigorosamente os impostos é o primeiro passo para garantir direitos. De nada adianta adotar postura crítica frente aos descalabros de governos e políticos se não fazemos nossa parte. A má administração pública, em todas as esferas, é fruto de muitas variáveis, inclusive da falta de mobilização dos setores da economia. As empresas se fortalecem quando formam alianças com concorrentes e parceiros em busca de soluções economicamente viáveis e socialmente justas.
Empresas engajadas na busca por resultados são mais proativas, mais mobilizadoras e mais detentoras de conhecimento. Portanto, são mais lucrativas. Agregar qualidade, valores éticos e mecanismos de sustentabilidade na forma de buscar o lucro representa importante instrumento competitivo.
Uma empresa socialmente responsável ressalta os valores dos funcionários e proporciona elevação da auto-estima. Quando ensinamos a outros por meio de nossos atos, estamos construindo também nossa credibilidade. Alguém duvida de que uma pessoa motivada e segura produz mais?
Pensando na performance mercadológica, o que seria mais importante em termos de resultado? Oferecer produtos de qualidade, pós-vendas eficiente, preço competitivo e pronta entrega ou contar com boa reputação? Tudo, obviamente, é de extrema importância. No entanto, mais do que as estratégias está a forma de conduzir as estratégias. Responsabilidade social é um conjunto de boas práticas corporativas que contempla todas as áreas da organização e visa, no longo prazo, a uma relação duradoura com os públicos de interesse (stakeholders). Para o consumidor, a percepção de produto vai muito além das características físicas. Perceber os valores da empresa interfere na decisão de compra.
A ética nos negócios é a ética do primeiro escalão da empresa. Pouco adianta dar início a ações responsáveis se o líder empresarial não acredita que isso seja importante para os negócios e a sociedade de maneira geral.
Qual o papel das empresas diante da necessidade do desenvolvimento social de um país? Bem, até por questão de sobrevivência, as organizações precisam se adequar periodicamente às mudanças da sociedade e prevenir quadros de degradação humana e ambiental. Interessa a alguém um país repleto de desigualdade, violência e injustiça social?
Mesmo não fazendo nenhuma ação social além das previstas por lei, toda e qualquer empresa exerce algum tipo de impacto além do econômico. A inércia empresarial também é capaz de mover — negativamente — uma sociedade.
Assim, o foco deste artigo é a prática da Responsabilidade Social Empresarial no Grande ABC, reconhecido pelo desenvolvimento econômico e industrial, bom nível de renda e de qualidade de vida. Tal perfil incentivou o estudo de como organizações de todos os portes da região mantêm e expõem práticas de RSE, bem como as formas que utilizam para comunicar suas ações.
Para tal objetivo, foi empreendida pesquisa de campo com 73 organizações da região conduzida por meio de entrevista com os gestores e observação direta, ancorada em 45 quesitos: 1. Busca transmitir bons exemplos de cidadania; 2. Incentiva a cultura; 3. Possui atividades esportivas, culturais e de lazer dentro e fora da empresa; 4. Preserva a limpeza local; 5. Preserva o meio ambiente; 6. Respeita a qualidade de vida; 7. Pratica atividades caracterizadas pela ausência de insalubridade; 8. Cumpre as leis trabalhistas; 9. Desenvolve programas de aumento de empregabilidade; 10. Investe na qualificação dos empregados; 11. Permite ao funcionário se expressar; 12. Possui cota para minorias; 13. Possui diversidade étnica; 14. Possui encontros de segurança no trabalho (Sipat); 15. Possui plano de carreira e oportunidades de crescimento dentro da empresa; 16. Possui programas de amparo ao funcionário; 17. Possui programas para minimizar o estresse; 18. Proporciona benefícios aos funcionários; 19. Valoriza as atitudes éticas dos funcionários; 20. Preocupa-se com o bem-estar do funcionário; 21. Ações voltadas ao lazer da comunidade; 22. Apoio ao desenvolvimento da comunidade; 23. Investimento na educação da comunidade; 24. Preocupação com a saúde da comunidade; 25. Permite o envolvimento comunitário nas ações de interesse coletivo; 26. Apoio, associação e/ou parceria com ONGs e entidades carentes; 27. Programas e/ou projetos sociais; 28. Possui boa relação com os stakeholders; 29. Possui comunicação transparente; 30. Disposta a mudanças positivas; 31. Sinergia com os parceiros; 32. Usa a propaganda de acordo com o Código de Defesa do Consumidor; 33. Usa a propaganda de acordo com o Conar (Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária); 34. Cumpre a legislação; 35. Cumpre o Código de Defesa do Consumidor; 36. Cumpre os direitos humanos; 37. Possui postura anti-racial; 38. Possui postura indiscriminatória; 39. Possui código de ética; 40. Evita negociações com instituições que não possuam padrões éticos; 41. Não possui casos de assédio físico e moral; 42. Não possui casos de fraudes ou desfalques; 43. Possui serviço de atendimento ao cliente; 44. Preocupa-se em assumir o erro perante cliente, fornecedor ou outro agente do mercado, corrigindo e compensando; 45. Preocupa-se com a satisfação dos clientes-consumidores.
O poder civil, a democracia, a
prioridade à vida com qualidade se
sobrepuseram ao interesse só comercial
Organizações empresariais e institucionais são componentes essenciais da sociedade, pois desempenham múltiplas funções que impactam na cidadania e qualidade de vida da comunidade. Geram empregos, disponibilizam produtos e serviços, constroem cidades, fortalecem a riqueza das nações, enfim, inserem-se no grande sistema de socialização.
A Responsabilidade Social Empresarial ocupa espaços desde meados do século passado, quando movimentos civis, trabalhistas e ambientais passaram a questionar as práticas empresariais. Em muitos momentos o desenvolvimento trazia no rastro perda de qualidade de vida. Se, de um lado, as organizações disponibilizavam mais estrutura de consumo, mais informações e índices crescentes de desenvolvimento, de outro, cidadãos e sociedade se ressentiam de efeitos colaterais como desequilíbrio na distribuição de renda, efeitos danosos ao meio ambiente, insalubridade no trabalho e consumismo. A mobilização social pressionando empresários e governo trouxe mudanças nesse quadro, estabelecendo maior responsabilidade social às organizações e ao próprio Estado.
Um dos fenômenos mais relevantes atualmente se refere à institucionalização das sociedades, em que o poder civil, a democracia, o estado de direito, a prioridade a padrões de qualidade de vida ganharam espaço e se sobrepõem a outros interesses, como o meramente lucrativo ou comercial. Empresas e instituições que desfrutavam de privilégios legais e políticos unicamente porque geravam exportações, produção e emprego sofreram grandes mudanças na gestão para incorporar outras prioridades sociais, sob pena de se verem marginalizadas diante da nova correlação de forças.
Foram incontáveis ao longo das últimas décadas casos de organizações que mudaram o programa de gestão tendo em vista o novo perfil de consumidor e cidadão: mais informado, mais bem amparado por entidades oficiais e não-governamentais, e ainda ciente de seu poder nas relações de consumo. Relacionar-se bem com o mercado, públicos de interesse e cidadãos tornou-se questão de sobrevivência e aceitação para qualquer organização,
lucrativa ou não. Assumir o papel de empresa-cidadã deve ser mais do que estratégia de marketing. Deve ser compromisso legítimo e distante de discursos vazios.
Por necessidades estratégicas, as organizações usam variadas formas de comunicação social, tanto em veículos nacionais e locais como internos (cartazes, comunicados, encontros, house-organs e outros). Portanto, estudar a responsabilidade social no Grande ABC é uma forma de apurar se o desenvolvimento regional, em termos empresariais, tem sustentabilidade também no plano social. Há uma infinidade de formas de comunicação
social no mercado. São desde formas amplas, lastreadas em técnicas complexas como campanhas de comunicação, canais de atendimento, jornais, mídias massivas e segmentadas, até formas limitadas como reunião, faixas, circulares e brindes. Algumas formas foram eleitas para o estudo:
Comunicação administrativa: memorando, carta, contrato, relatório, holerite, reuniões, comunicados, ordem de serviço e ofício. Os documentos que circulam entre os níveis hierárquicos apresentam, além de informações técnicas e legais, mensagens diversas como apelos à segurança e integração comunitária.
Comunicação interna: conta com procedimentos dirigidos somente aos públicos internos, podendo ser classificados como publicações midiáticas como rádio/TV interna, cartazes indoor, intranet, circulares, e-mail, mural, placas de avisos e publicações internas. Há também manifestações integrativas tais como eventos, exposições, festas, assembléias, confraternizações, jogos, meios educativos, teatro e reuniões. E há ainda ações de aperfeiçoamento funcional, como cursos e treinamento, além de procedimentos diversos como caixa de sugestões ou formas alternativas de comunicação.
Comunicação mista: pode dirigir-se tanto aos públicos internos, externos ou massivos. Pode ser classificada em publicações midiáticas como campanhas, meios de comunicação de massa (jornais, revistas, rádio, TV, site), comunicados, anúncios publicitários, faixas, informativos, publicações externas e promoções de venda. Há também as ações de relacionamento, tais como canais de atendimento, telemarketing, mala direta, feiras, manual da empresa ou produto, palestras, patrocínio, assessoria de imprensa e relações públicas. E há ainda o item procedimentos diversos, como as formas orais, gestuais, visuais, visitas e meios alternativos de comunicação.
Prática esportiva e cultural, educação da
comunidade, ter código de ética e qualificar
funcionário destacam-se nas ações
Os resultados mostram que as organizações do Grande ABC pesquisadas, para divulgarem essas ações, utilizam um mosaico de formas de comunicação, prevalecendo os procedimentos dirigidos e voltados para o público interno. Os quesitos de responsabilidade social mais retratados em ações de comunicação foram práticas esportivas e culturais, qualificação dos funcionários, investimento na educação da comunidade, uso da propaganda de acordo com o Código de Defesa do Consumidor e o fato de a empresa contar com código de ética. Todos estão relacionados com o desejo de as organizações darem visibilidade a um discurso ético-moral.
Já os quesitos menos passados para a comunicação foram os relativos à cota para minorias, diversidade étnica, propaganda de acordo com o Conar Código Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária), postura não-discriminatória, casos de assédio físico e moral, além de casos de fraudes e desfalques. Todos refletem assuntos que envolvem aspectos jurídicos e legais, além de suscitarem grande polêmica junto ao público interno e externo. As empresas optaram por evitar abordar os temas publicamente.
O uso de ferramentas de comunicação social foi bastante abrangente, revelando dezenas de opções e suportes. Os quesitos de RSE que mais visibilidade tiveram em termos quantitativos foram o uso da propaganda de acordo com o Código de Defesa do Consumidor (com 216 menções) e ter boa relação com os stakeholders, com 126 menções. Tais resultados indicariam o uso disseminado da propaganda comercial em diferentes suportes, situações e servindo a vários propósitos, mas destacando-se pela preocupação de atender os aspectos legais. Indicariam também que os públicos de interesse de uma organização são diversos e complexos, sendo necessárias muitas formas de comunicação para atingi-los, inclusive com mensagens de responsabilidade social.
Algumas formas de comunicação se destacaram ao serem mais utilizadas para determinados quesitos de RSE:
Campanhas: “(Quesito 24) Preocupação com a saúde da comunidade”. As ações que visam a proporcionar saúde à comunidade envolvem uso articulado de formas de comunicação e, por vezes, públicos que precisam ter informações em processos cíclicos, o que demandaria o uso predominante de campanhas.
Central de Atendimento: “(43) Possui serviço de atendimento ao cliente”. Como a central de atendimento ou similar vale-se de banco de dados e recursos para promover o marketing de relacionamento, é uma forma bastante apropriada a esse fim.
Carta: “(31) Sinergia com os parceiros”. Como parcerias são estratégicas para as corporações, o trâmite de documentos e as mensagens direcionadas tornam-se apropriadas para relacionamento em que a carta pode desempenhar tal função.
Cartaz: “(21) Ações voltadas ao lazer da comunidade”. Programas ou eventos voltados ao lazer da comunidade devem contar com divulgação em ambientes diferenciados (interiores e exteriores) utilizando meio que permita colocar texto para informações e imagens para incentivar à participação de uma coletividade. São necessidades que o cartaz supre com eficácia.
Confraternização: “(17) Possui programas para minimizar o estresse”. O estresse é um dos grandes males que o ambiente competitivo causa ao público interno, algo que pode ser contrabalançado com eventos ou momentos de confraternização, quando seria possível uma comunicação mais interativa e integrativa.
E-mail: “(28) Possui boa relação com os stakeholders”. Os públicos de interesse, além de estratégicos, precisam ser trabalhados no dia-a-dia, muitas vezes com informações interativas que o e-mail possibilita.
Informativo: “(1) Busca transmitir bons exemplos de cidadania”. Os informativos são meios produzidos a baixo custo e desfrutam de credibilidade (é um meio jornalístico). Mensagens que mostram bons exemplos de cidadania podem ter nessa forma de comunicação algo apropriado por essas características de conveniência.
Jogos: “(3) Possui atividades esportivas, culturais e de lazer dentro e fora da empresa”. Os jogos permitem o uso de todos os sentidos humanos para que as pessoas se expressem e se identifiquem perante os grupos referenciais. São formas lúdicas e integrativas que proporcionam convívio, integração e inclusão, algo que se ancora perfeitamente nas atividades de lazer e esportes tanto dentro como fora da empresa.
Manual: “(39) A empresa possui um código de ética”. Ao disponibilizar o código de ética, a empresa tenta mostrar ao público interno a relevância dos valores éticos no cotidiano e na vida de todos da organização.
Meios Educativos: “(23) Investimento na educação da comunidade”. Os meios educativos seriam cursos externos, concursos de bolsas, feira de ciências, eventos educacionais, ou seja, atividades que estimulariam a inserção das pessoas na educação.
Outras Formas: “(27) Programas e/ou projetos sociais”. Esse quesito de responsabilidade social recebeu a gama mais diversificada de formas de comunicação, talvez por sua complexidade e abrangência.
Palestras: “(23) Investimento na educação da comunidade”. As palestras são apropriadas nesse quesito por propiciarem o contato direto do especialista com a platéia ou grupo de interesse, além de possibilitar uma ação integrativa.
Publicação Interna: “(1) Busca transmitir bons exemplos de cidadania”. As publicações internas (jornais, livros, cartilhas) mostram-se meios apropriados (textos e ilustrações) para passar histórias, casos e fatos ligados à cidadania.
Site: “(22) Apoio ao desenvolvimento da comunidade”. Tal quesito depende, por vezes, de uma forma de comunicação imediata, além de prática e interativa, algo que o site da organização pode proporcionar com oferta de bens e produtos, além de projetos sociais.
Sugestões: “(11) Permite ao funcionário se expressar”. A tradicional caixa de sugestões parece ser um meio ainda bastante útil quando se quer obter a opinião do funcionário sobre condições da empresa e atividades de responsabilidade social. Seu caráter sigiloso e anônimo permite a todos os níveis hierárquicos se expressar sem sofrer pressões decorrentes da opinião manifestada. Também é um meio bastante conveniente, pois geralmente está disponível em locais de fácil acesso.
Treinamento: “(10) Investe na qualificação dos empregados”. Os encontros e cursos de treinamento são referências para a qualificação dos funcionários, muitas vezes em função dessa experiência estar ligada à prática específica de suas funções e por ser fundamental para a continuidade ou promoção na carreira.
Portanto, as práticas de responsabilidade social das empresas pesquisadas no Grande ABC estão associadas a um leque de ferramentas de comunicação. As grandes áreas de mídia — como propaganda, relações públicas, jornalismo, rádio, promoção de vendas e marketing direto — precisam considerar todas as formas se quiserem se associar às estratégias mercadológicas que gerenciam a responsabilidade social nas organizações.
Por ora, o que se pode afirmar é que as organizações regionais investem em larga escala em ações sociais que contemplam públicos interno e externos. O investimento nem sempre é percebido por diversos motivos, entre os quais a ausência de meios eletrônicos de forte penetração regional que poderiam pautar a atuação das empresas, bem como o distanciamento das grandes organizações do dia-a-dia regional (empresa de atuação nacional demanda comunicação com abrangência nacional). Cabe, assim, às organizações do Grande ABC a adoção de políticas de comunicação continuada com seus públicos de interesse.
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16/09/2008 Primeiro escalão dita ética e responsabilidade social