Imprensa

Diário do Grande ABC inicia
2024 com fantasia editorial

DANIEL LIMA - 17/01/2024

Pretendia publicar este texto na semana passada, mas fui atropelado por emergências que não poderiam ser proteladas. O que se segue foi preparado na semana anterior à volta ao trabalho, dia oito último. Volta ao trabalho é força de expressão. No caso específico, volta ao processo de edição, porque se há algo que faço todos os dias, faça o tempo que fizer, é escrever. Não vou abrir mão de minha terapia. Vamos, então, ao que escrevi e que não perde a validade temporal.  Muito diferentemente disso. 

Não tem mesmo jeito: minha alma de regionalista combinada com a de ombudsman não conseguiu deixar para lá o primeiro editorial de 2024 do Diário do Grande ABC. O primeiro de janeiro de opinião formal do Diário do Grande ABC sobre o território regional, seja Grande ABC, seja ABC Paulista, seja lá o que for, foi de lascar. 

Para entender didaticamente o que apontei preliminarmente com um conjunto de trechos que formaram uma colcha de retalhos em forma de fake news acredito que o melhor mesmo é reproduzir integralmente o material oficial do Diário do Grande ABC e, em seguida, destrinchá-lo à luz do jornalismo associado a cidadania regional e outros apetrechos. Vamos lá então? Primeiro, o Editorial do Diário do Grande ABC, sob o título “Salutar debate de ideias”:  

 O Grande ABC se construiu como potência econômica nacional e ator relevante no cenário internacional graças à participação ativa de várias instituições da sociedade civil organizada. Uma heterogeneidade de pensamentos foi fundamental para que a região se consolidasse como polo da indústria automotiva, mas não só isso: as sete cidades abrigaram grandes indústrias de vários segmentos, foram pioneiras em políticas públicas que balizaram projetos transformadores em outros municípios e até no Brasil, acolheram universidades com produção constante de conhecimento e até mesmo tiveram papel mais do que ativo na redemocratização do País. Daqui surgiram ministros de Estado, presidente da República, ministros do Supremo Tribunal Federal.   

O que se viu nos últimos anos, porém, foi uma tentativa de alguns atores da política regional de ceifar a miscelânea de ideias para que, a fórceps, todo Grande ABC pensasse de uma só forma: a que eles queriam. Não é à toa que foi o período no qual a região mais sentiu perdas significativas, sobretudo na economia. Em sete anos, duas grandes montadoras de veículos encerraram suas atividades – a Ford e a Toyota, em São Bernardo – e uma constantemente ameaça deixar o Brasil – a General Motors, de São Caetano.  

A consequência de uma região que tem sua divergência calada é um empobrecimento de discussões em um período no qual o mundo vive seu momento mais desafiador. Os modelos de trabalho estão mudando, há avanço da inteligência artificial, as redes sociais transformaram o modo como as pessoas se relacionam – para o bem e para o mal. É impossível boas ideias para uma região tão complexa saírem de uma única cabeça. Ainda mais se essa cabeça tem como foco a perpetuação exclusiva de seu poder.  

Que em 2024 as instituições do Grande ABC se reconectem com suas origens para pensar o futuro da região. O Diário, como porta-voz das sete cidades, seguirá aberto ao debate de propostas e dará voz às mais variadas correntes de pensamento, pilar inegociável desta casa desde maio de 1958.  

VEZ DE CAPITALSOCIAL 

Agora vamos ao que chamaria de réplica de CapitalSocial. Como vamos ter um conjunto de contrapontos, acho que o jogo ficaria mais interessante a partir de uma réplica ao próprio título. Decidi optar por “Nefasta controladoria”. Agora, seguem as respectivas ponderações.  

DIÁRIO DO GRANDE ABC  

O Grande ABC se construiu como potência econômica nacional e ator relevante no cenário internacional graças à participação ativa de várias instituições da sociedade civil organizada.   

PRIMEIRAS ESCORREGADELAS  

Não existe nexo histórico. O Grande ABC foi escolhido extracampo regional, ou seja, pelo governo federal de então, exclusivamente por questões geográficas, por estar no meio do caminho entre a Capital de consumo e o Porto de Santos exportador. Nada, nenhum movimento local foi interposto sequer como sugestão para que as montadoras de veículos e outras matrizes produtivas desembarcassem na região.  

DIÁRIO DO GRANDE ABC 

Uma heterogeneidade de pensamentos foi fundamental para que a região se consolidasse como polo da indústria automotiva, mas não só isso: as sete cidades abrigaram grandes indústrias de vários segmentos, foram pioneiras em políticas públicas que balizaram projetos transformadores em outros municípios e até no Brasil, acolheram universidades com produção constante de conhecimento e até mesmo tiveram papel mais do que ativo na redemocratização do País. Daqui surgiram ministros de Estado, presidente da República, ministros do Supremo Tribunal Federal.   

VEZ DE CAPITALSOCIAL  

Além de não ter participação de qualquer ordem, institucional oficial ou não, no processo de industrialização maciça com a chegada das automotivas, sempre um Estado Capitalista à parte das Prefeituras e das instâncias corporativas da região, jamais houve qualquer movimento de autoridades públicas do Executivo direcionado a qualquer coisa que lembre cooperação continuada, orgânica, tanto para o fortalecimento como, em seguida, aos cuidados com uma região que ganhou velocidade desindustrializadora. Com uma ou outra exceção de Ensino Superior voltado diretamente às atividades econômicas, casos da FEI (Faculdade de Engenharia Industrial) e também à ETI (Escola Técnica Industrial), as indústrias da região seguiram o receituário comum aos municípios que constam da lista de escolas técnicas profissionalizantes ou principalmente a treinamentos internos. O recheio desse bolo indigesto de distanciamento entre produção e academia é a Universidade Federal do Grande ABC. Trata-se de uma escola de Ensino Superior com baixíssima inserção nos meios de produção da região. A UFABC é um desfile de teorias que viram produtos internacionais. Jamais preparou um só programa de interação com as forças econômicas da região.  Quanto aos ministros de Estado, o Editorial do Diário se refere a Luiz Marinho e a Lewandowski, e o presidente, claro, é Lula da Silva, egresso do movimento sindical mas que construiu carreira politica fora do provincianismo regional, abraçado por intelectuais e por alas da Igreja Católica, além do sindicalismo getulista. Nada, portanto, que possa ser catalogado como essência de organicidade de capital social ou algo assemelhado na região.  

DIÁRIO DO GRANDE ABC  

O que se viu nos últimos anos, porém, foi uma tentativa de alguns atores da política regional de ceifar a miscelânea de ideias para que, a fórceps, todo Grande ABC pensasse de uma só forma: a que eles queriam. Não é à toa que foi o período no qual a região mais sentiu perdas significativas, sobretudo na economia. Em sete anos, duas grandes montadoras de veículos encerraram suas atividades – a Ford e a Toyota, em São Bernardo – e uma constantemente ameaça deixar o Brasil – a General Motors, de São Caetano.  

VEZ DE CAPITALSOCIAL 

O propósito do Editorial do Diário do Grande ABC, numa pegada constante que poderia ter algum potencial de combate justo e merecido, é atingir o atual prefeito de São Bernardo, Orlando Morando, desafeto da casa, bem como José Auricchio, prefeito de São Bernardo, também alvo de noticiário típico de dois pesos e duas medidas em relação aos demais titulares dos Paços Municipais da região. O Diário do Grande ABC perdeu o equilíbrio no combate insano aos titulares dos dois Paços Municipais Os sete anos de supostos estragos históricos que manchariam a reputação do prefeito de São Bernardo não contam com sustentação econômica. Diferentemente disso. Inapropriadamente, o jornal menciona a saída de duas multinacionais (uma de fato montadora de veículos, a segundo uma autopeças), como obra-prima do descalabro de Orlando Morando. Bobagem. Empresa nenhuma, exceto como excepcionalidade, evade-se ou joga a toalha por uma única razão, seja qual for. Principalmente na região. A desindustrialização de São Bernardo e da região começou já de forma incisiva nos anos 1990 (a primeira edição de LivreMercado/CapitalSocial, em março de 1990, trata disso), por conta do movimento sindical. E a operação desmonte ganhou novos aliados, como a guerra fiscal, entre outros. O Diário do Grande ABC despreza as estatísticas e os fatos para direcionar erroneamente a bateria de responsabilização ao prefeito atual. Os oito anos do antecessor, Luiz Marinho, do PT, também por conta de fatores macroeconômicos, ou principalmente por isso, significaram perda líquida do PIB Geral de São Bernardo de quase 50%. Enquanto isso, em cinco anos, Morando contabiliza quase 10% de recuperação acumulada.  

DIÁRIO DO GRANDE ABC 

A consequência de uma região que tem sua divergência calada é um empobrecimento de discussões em um período no qual o mundo vive seu momento mais desafiador. Os modelos de trabalho estão mudando, há avanço da inteligência artificial, as redes sociais transformaram o modo como as pessoas se relacionam – para o bem e para o mal. É impossível boas ideias para uma região tão complexa saírem de uma única cabeça. Ainda mais se essa cabeça tem como foco a perpetuação exclusiva de seu poder.   

VEZ DE CAPITALSOCIAL 

É muito pouco provável que alguém que não seja suspeito de contar uma anedota sem graça identifique em Orlando Morando o personagem com poderes de calar o distinto público, como afirma o Editorial do Diário do Grande ABC. Em princípio, para valer mesmo, imaginei que a frase seria a abertura de uma confissão pública do próprio jornal. Na sequência, ainda ingênuo, voltei a acreditar que o Diário do Grande ABC estava mesmo prestes a confessar-se o destinatário natural da opinião pública regional, o que já seria uma tremenda bobagem. Afinal, não existe opinião pública nem regionalidade para tanto. O Diário do Grande ABC comete um grande erro ao direcionar a Orlando Morando a pretensão de controlar a opinião pública regional. Afinal, se há algo de que prescinde o prefeito da Capital Econômica da região – e isso se converte numa falha monumental – é a capacidade de contar com um marketing mais efetivo. Nesse ponto, perde de lavada para o vizinho prefeito de Santo André, Paulinho Serra, objeto de uma santificação administrativa e política que não condiz com a realidade. Como estávamos cansados de provar sem que a política editorial de CapitalSocial desvie-se um centímetro sequer dos antecessores dos atuais prefeitos da região. Basta consultarem os arquivos.   

DIÁRIO DO GRANDE ABC  

Que em 2024 as instituições do Grande ABC se reconectem com suas origens para pensar o futuro da região. O Diário, como porta-voz das sete cidades, seguirá aberto ao debate de propostas e dará voz às mais variadas correntes de pensamento, pilar inegociável desta casa desde maio de 1958.  

VEZ DE CAPITALSOCIAL  

As instituições do Grande ABC não precisam se reconectarem com suas origens porque, com algumas oscilações aqui e acolá, mas sempre numa frequência de inapetência coletiva, seguem o funeral de uma desorganização atávica, improdutiva, servil e quando não oportunista – principalmente entre aquelas que têm insistente frequência de relações espúrias com o Poder Público Municipal. O Diário do Grande ABC insiste em ser porta-voz da região. Isso tem um significado preocupante, como já escrevemos: como ser porta-voz de algo que não existe na prática? Ou alguém tem alguma informação sigilosa que dê lastro a qualquer ideia encaminhadora à existência de algo que lembre uma expressão surradíssima nas páginas do Diário do Grande ABC? Estou me referindo à “sociedade civil organizada”. Isso é uma piada de mau gosto, porque a realidade é mesmo de “sociedade servil desorganizada”. Ou uma sociedade de indivíduos e grupos de pressão em permanente conluio com os poderosos podres poderes locais.  



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